A CASA DO OSCAR

Monday, July 02, 2007

SOMOS UM SÓ POVO, UM SÓ MUNDO, DIZ MAC MAHARAJ

Por Oscar Henrique Cardoso

Brasília - "Cada povo tem o direito de desenvolver sua própria língua e cultura. Não se trata de um ato de caridade, mas sim uma condição essencial que deve ser oferecida a todas as culturas. Pela primeira vez na História podemos falar de uma só raça, a raça humana". Esses são alguns pensamentos que o professor e político sul-africano Mac Maharaj apresentou aos presentes no Seminário Internacional sobre Diversidade Cultural: Práticas e Perspectivas, realizado de 27 a 29 de junho último, em Brasília. Maharaj falou sobre os problemas globais, com ênfase a temáticas relacionadas ao continente africano. Mac Maharaj é professor e político sul-africano. Participou junto com Nelson Mandela da luta pela democracia racial na África do Sul, onde foi preso e torturado. Após retorno do exílio, participou da transição democrática e se tornou ministro do primeiro governo pós-apartheid. Maharaj leciona história da África do Sul no Bennington College e é organizador do livro Mandela: Retrato Autorizado.
Com prefácio de Kofi Annan, ex-secretário geral da ONU, e introdução do arcebispo anglicano emérito da Cidade do Cabo, Desmond Tutu, Mandela: Retrato Autorizado conta com 60 entrevistados em todo o mundo. São 60 pontos de vista diferentes sobre Mandela, além de destacar as mais variadas facetas de um dos grandes homens do século XX, que promoveu a reconexão entre a justiça e a política. Mac Maharaj e Ahmed Kathrada localizaram todas essas fontes e realizaram uma pesquisa de conteúdo e fotográfica intensa que resultou em uma coletânea de imagens raras e algumas inéditas. Mac Maharaj passou 12 anos preso em Robben Island, lendária ilha-prisão de segurança máxima ao largo da Cidade do Cabo, com Mandela, e comenta que "o livro reuniu um conteúdo tão concreto que materializou a constatação de que os fatos passados durante a transição da África democrata são exatos". Na sua palestra Democracia e Multiculturalismo no Mundo Contemporâneo Maharaj salientou que as diferenças culturais são necessárias porque estimulam a curiosidade e movem as pessoas. A respeito do imperialismo cultural, o professor sul-africano foi enfático: "Não importa que tipo de imperialismo cultural é aplicado, ele é sempre uma enaltação da inumanidade". E completou que é preciso que nos livremos da idéia de cultura superior versus cultura inferior, pois só assim será possível permitir que o homem celebre a sua própria condição de humano. Ao deixar no ar questões como "O que é o mundo contemporâneo?", o palestrante aproveitou para abordar assuntos geopolíticos, destacando a China, a Índia e o Brasil como possíveis potências mundiais. Quando questionado sobre o futuro dos métodos tradicionais de transmissão do conhecimento, optou por uma metáfora simples para ilustrar sua opinião: "uma caixa de ferramentas, por mais moderna que seja, sempre terá instrumentos tradicionais como martelo e chave de fenda". E emendou, "a tecnologia é uma faca de dois gumes, você pode cortar o que pretende cortar de fato ou ferir a si mesmo no caso dela não se adequar ao seu objetivo inicial". Sobre a realidade social da África do Sul, Maharaj falou com especial ênfase sobre a realidade de sua nação. Ponderou que ainda são enfrentados grandes desafios, como a necessidade de um sistema educacional que abrigue todas as crianças, pois o sistema educacional é uma das bases de promoção da diversidade cultural. Em entrevista ao Informe Palmares, Maharaj fala de sua convivência com Nelson Mandela, da discriminação contra cidadãos africanos em países europeus e ainda ressaltou o valor que dá ao Brasil como potência futura e também uma nação aberta a dialogar sobre a pluralidade com o restante da América Latina:
Informe Palmares: O que significou para o cidadão sul africano Mac Maharaj conviver com Nelson Mandela?
Mac Maharaj: Você vai me colocar em problemas... (risos). Ele deu a liberdade, me incentivou a liberdade. Esta é uma parte minha. Foi um grande privilégio viver por 12 anos na prisão com ele (Mandela) e aprender com ele, tê-lo como mentor e aprender as verdadeiras qualidades de um líder, que podem ser resumidas em uma palavra: um verdadeiro líder é um servidor do povo. E esse é o problema porque ele não quer ser um servidor do povo.
Informe Palmares: Os crescentes casos de discriminação contra cidadãos africanos em países europeus, seja contra atletas ou contra trabalhadores são para o senhor também uma preocupação?
Maharaj: Em primeiro caso, a discriminação é um caso cultural e racial e não quero dizer o tanto que isso é enjoado, chato. Em segundo caso, a discriminação é baseada em questões econômicas, ou seja, o que se observa é que as nações européias querem sim ter os africanos trabalhando como mão-de-obra barata para após então retornarem para seus lugares de origem. Os refugiados africanos estão correndo da pobreza para a prosperidade na Europa. O que também é um problema, porque a pobreza na África está crescendo, pois tem como base as regras européias em relação à África. A pobreza existe em qualquer país. E a pobreza como um todo ameaça a estabilidade de um país.
Informe Palmares: Como o senhor considera o fato de o Brasil estar puxando o debate em torno da diversidade na América Latina, construíndo assim uma nova ordem mundial?
Maharaj: É fantástico. É o tipo de competição que temos que ter no mundo. Temos que competir entre si. A diversidade como competição é um elemento fundamental e a competição promove o dinamismo no mundo.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home